sexta-feira, janeiro 20, 2006

Razões da Crise em Portugal

Economia: Razões da Crise em Portugal


Hoje em dia, é um dado adquirido que a economia nacional não se encontra bem de saúde, existem problemas estruturais graves, que constituem entraves ao nosso desenvolvimento. O caminho a seguir é simples, mas talvez muito penoso e difícil de percorrer.

Se analisarmos o Portugal saído do tão afamado 25 de Abril de 1974, data que constitui um marco na história nacional, constatamos que estávamos atrasados em relação aos nossos congéneres europeus em pelo menos 20 anos. O modelo de crescimento económico que vigorou desde o 25 de Abril, foi assente na mão-de-obra barata, resultante das poucas qualificações que tínhamos, e que continuamos a ter, face aos demais países da Europa (alguns até mais pobres do que nós).

A entrada de capital estrangeiro no país, foi inevitável, ainda mais a partir de 1986, com a entrada do país na então denominada Comunidade Económica Europeia. À medida que a integração europeia se ia consolidando, Portugal tornou-se um país atractivo para o Investimento Directo Estrangeiro, por um lado funcionava como a “porta” de entrada mais barata de produtos na Europa (países não europeus), por outro, como um país de mão-de-obra pouco qualificada e mal remunerada (países europeus). A verdade é que este modelo funcionou, foram criados empregos, as famílias passaram a poder comprar casa e a trocar de carro regularmente, e os sucessivos governos procuraram sempre manter o país “baratinho”, recorrendo muitas vezes à desvalorização monetária para manter a competitividade do país.

A outra face do modelo de desenvolvimento adoptado, foi que teve implicações graves no modelo de organização social do próprio país. Os salários baixos traduziram-se em famílias em que os dois membros do casal tiveram necessidade de trabalhar fora de casa, de modo a contribuir para o escasso orçamento familiar. Pode-se então reflectir, se a falta de acompanhamento familiar de muitas crianças, criadas com a televisão e no ambiente despersonalizado de cresces e infantários, não teve implicações nos adultos que estivemos formar. Será que a baixa qualificação que temos hoje, não resulta de crianças que nunca tiveram uns pais suficientemente disponíveis para a sua educação?

Em Dezembro de 1995, surge mais um passo no sentido da integração europeia, o mais importante desde o tratado Maastricht em 1992 (o que definiu a existência de mercado único europeu), os parceiros europeus começaram a ponderar a adopção de uma moeda única.

Em 1999, as taxas de conversão são fixadas de forma irrevogável, e o governo perde um instrumento que até então funcionava como motor de competitividade nacional. Juntamente com a moeda única, e em prol da competitividade da zona euro, o pacto de estabilidade e crescimento assume relevância, no sentido de proporcionar equilíbrio orçamental na zona Euro, e não permitir processos inflacionistas. O pacto de estabilidade e crescimento torna-se fundamental para a estabilidade do eurosistema, nenhum governo pode constantemente estar a gastar mais do que o que produzia, pois as consequências não são só para si, mas para todos os países integrantes.

Sem querer apontar responsáveis, foi a partir de 1998/99 que se começou a traçar um caminho que vem desembocar na crise orçamental que hoje nos encontramos. Os últimos anos da década de 90, foram épocas de crescimento e prosperidade económica, em que inúmeras famílias conseguiram aumentar o seu rendimento disponível através do recurso ao crédito, aproveitando a baixa de taxas de juro resultantes do processo de criação da moeda única. O governo, que devia acautelar a sua situação orçamental, ou seja, aproveitar épocas de crescimento para pagar a sua dívida, uma vez que o aumento da actividade económica implica aumento de receitas por via dos impostos, teve uma atitude contrária, imitando as famílias. O estado foi despesista e displicente, aumentou o número de efectivos da administração pública, ignorou as ineficiências existentes no funcionamento da máquina do estado, nomeadamente ao nível cobrança de impostos, e acima de tudo perdeu-se a oportunidade de reformular todo o conceito de administração pública, torná-la mais eficiente, mais virada para o bem comum e não para os interesses pessoais de alguns.

Enquanto houve dinheiro, tudo estava bem, as famílias recorriam cada vez mais ao crédito, comprometendo a sua afectação dos rendimentos futuros, mas com um rendimento presente elevado, o que se traduziu num aumento artificial da sua qualidade de vida. O estado assumiu uma atitude despesista, sem nunca acautelar o futuro.

O que acontece actualmente é que as famílias estão cada vez mais endividadas, não conseguindo manter padrões de consumo a que estavam habituadas, situação ainda agravada pelo aumento do desemprego. A função pública é ineficiente, contando com um número grande de funcionários pouco produtivos. O consumo diminui, levando ao não escoamento das produções, as empresas fecham e criam mais desemprego. O estado está de mãos atadas, numa fase em que se devia substituir às famílias no consumo, de modo a impulsionar a economia.

A resposta à crise está nas exportações, a única forma de impulsionar a actividade económica nacional, mesmo assim, não podemos esquecer a crescente concorrência de mercados emergentes, como a China, cuja vantagem preço é inigualável. O alargamento da União Europeia a 25 países, com a entrada de países mais qualificados e com salários mais baixos traz um novo desafio a Portugal.

Portugal está a passar uma fase de mudanças, em que estamos a pagar caro uma atitude passada displicente de sucessivos governos. Esperemos que as coisas mudem rapidamente, mas a crise veio para ficar, por isso temos que apertar o cinto e aguardar que os nossos parceiros comerciais externos comprem produtos “made in Portugal”. Ao mesmo tempo, temos que investir seriamente na educação e inovação, temos que criar coisas novas, diferentes do que os outros fazem, pois já não somos o país da mão-de-obra barata de outrora. Existem outros, mais qualificados e mais baratos do que nós, pelo que nos temos que valorizar.